Dia do Estatuto da Terra: Reforma agrária segue sendo tema polêmico no país

Especialista explica sobre o assunto e o porquê ele leva à tantas discussões

De acordo com o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), o Brasil tem cerca de 145 mil famílias acampadas à espera de um lote para cultivar: com 2.045 acampamentos de sem-terra no país. Segundo o Ministério do Desenvolvimento Agrário e Agricultura Familiar (MDA), mais de 15 mil assentamentos foram feitos neste terceiro mandato do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Em 30 de novembro é celebrado o Dia do Estatuto da Terra, o qual regulamenta os direitos e obrigações referentes aos imóveis rurais para a execução da reforma agrária e promoção da política agrícola.

Há muita desinformação à respeito do tema e a advogada Márcia Alcântara, especialista em direito agrário, esclarece à respeito. “A reforma agrária é uma política pública de redistribuição de terras, conduzida pelo Estado, com o objetivo de corrigir desigualdades históricas na estrutura fundiária, promover o uso produtivo do solo e garantir que as propriedades cumpram sua função social, conforme previsto na Constituição e no Estatuto da Terra”, explica.

Terras afetadas
E ela não pode ser aplicada em qualquer propriedade, sendo que recai sobre imóveis rurais privados que não cumprem sua função social, avaliada por quatro critérios constitucionais. “São o aproveitamento racional e adequado; utilização adequada dos recursos naturais; respeito às relações de trabalho; exploração que favoreça o bem-estar dos proprietários e trabalhadores”, pontua a especialista, que integra o escritório Celso Cândido Souza Advogados.

Conforme a advogada, terras públicas, tanto federais quanto estaduais, também podem ser destinadas à reforma agrária, além de áreas griladas ou com cadeia dominial irregular e imóveis incorporados ao patrimônio da União por decisão judicial. “Não incide a desapropriação para a finalidade de reforma agrária as pequenas e médias propriedades produtivas; propriedades familiares e terras em plena exploração agropecuária”, destaca. O tamanho da propriedade varia de 5 a 110 hectares conforme o município e critérios técnicos que devem ser observados.

Beneficiários
Vale destacar que as terras provenientes da reforma agrária no Brasil são destinadas a trabalhadores rurais sem terra ou com terras insuficientes para seu sustento e o de sua família, que se inscrevem em um processo seletivo conduzido pelo Incra. Contudo, a especialista lembra que é preciso observar alguns critérios.

“Não pode ser funcionário público (exceto professores); não ser proprietário rural; ter renda familiar até três salários mínimos; não ter sido excluído de projeto anterior; ter experiência agrícola comprovada (mínimo 5 anos); ter residência na região há mais de cinco anos; trabalho em condição análoga à escravidão e família com maior número de dependentes”, afirma.

Polêmicas sobre o tema
Márcia Alcântara lembra que o debate sobre a questão atravessa gerações e continua a dividir o país. “A reforma agrária permanece como um dos temas mais controversos da agenda nacional. Enraizada em disputas históricas e marcada por tensões sociais, econômicas e políticas, a questão da terra no Brasil segue sendo palco de embates que envolvem proprietários, trabalhadores rurais, movimentos sociais e autoridades”.

Viabilidade econômica e produtiva, concentração de terras e desigualdade, direito à propriedade versus função social, conflitos ideológicos e movimentos sociais, insegurança jurídica e corrupção, além de falta de políticas públicas integradas são pontos citados pela especialista em direito agrário que levam à debates e desacordos sobre o assunto.

“Na minha opinião, a reforma agrária mexe com interesses profundamente enraizados e expõe dilemas entre poder, justiça social e desenvolvimento econômico. Sem consenso sobre como equilibrar esses aspectos, o tema continua a ser um dos mais explosivos da política brasileira”, afirma. “A reforma agrária não deveria ser usada como bandeira ideológica. É uma questão de eficiência econômica, justiça social e sustentabilidade ambiental. Enquanto o país se perde em disputas políticas”, conclui a advogada.