
STF derruba presunção de boa-fé na compra de ouro e determina medidas de controle para coibir garimpo ilegal
Em julgamento virtual encerrado na última sexta-feira (21/3), o Supremo Tribunal Federal (STF) pôs fim à presunção de boa-fé nas compras de ouro por pessoas jurídicas. Por unanimidade, o Plenário declarou a inconstitucionalidade do § 4º do artigo 39 da Lei nº 12.844/2013, que dispensava a apresentação de documentos comprobatórios da origem legal do mineral em transações comerciais, bastando o arquivamento das informações prestadas pelo vendedor.
A decisão foi tomada no julgamento conjunto das Ações Diretas de Inconstitucionalidade (ADIs) 7.273 e 7.345, ajuizadas, respectivamente, pelo Partido Socialista Brasileiro (PSB) e pela Rede Sustentabilidade e pelo Partido Verde (PV). Para o relator, ministro Gilmar Mendes, a norma fragiliza o controle da cadeia produtiva do ouro, incentiva a comercialização de minério extraído de forma ilegal e viola o princípio da precaução ambiental, previsto no artigo 225 da Constituição Federal.
“O dispositivo impugnado, ao presumir legalidade e boa-fé do adquirente de ouro, compromete os instrumentos de controle de uma atividade inerentemente poluidora, incentivando a comercialização do minério extraído ilegalmente”, afirmou o ministro no voto.
Seguindo voto do relator, a Corte também reconheceu que a norma contribuiu diretamente para o avanço do garimpo ilegal, especialmente em áreas de proteção ambiental e terras indígenas, provocando graves impactos sociais e ambientais — como desmatamento, contaminação de rios por mercúrio, disseminação de doenças e violência em regiões de exploração mineral.
Origem irregular do ouro
Dados apresentados nos autos por órgãos como a Polícia Federal, Ministério da Justiça e Agência Nacional de Mineração (ANM) revelam que cerca de 30% da produção nacional de ouro tem origem irregular. Investigações recentes apontam ainda a participação de Distribuidoras de Títulos e Valores Mobiliários (DTVMs) no escoamento do minério ilegal, em um processo conhecido como “esquentamento” do ouro.
Além de declarar a inconstitucionalidade do dispositivo, o STF determinou que o Poder Executivo federal adote medidas normativas e administrativas para reforçar o controle da origem do ouro e coibir a atuação de DTVMs na comercialização de minério ilegal. A Corte também exigiu que órgãos como ANM, Banco Central, ICMBio, Casa da Moeda e Polícia Federal atuem de forma coordenada na fiscalização da atividade.
Segundo Gilmar Mendes, é imprescindível interromper o ciclo de degradação ambiental e de fortalecimento do crime organizado na Amazônia. “É necessário romper com o consórcio espúrio formado entre garimpo ilegal e organizações criminosas, o que justifica não apenas a declaração de inconstitucionalidade do dispositivo legal, como também a adoção imediata de providências efetivas de fiscalização”, concluiu.