Bebê reborn, deepfakes e solidão

Especialista em IA alerta sobre o perigo das relações superficiais em um mundo hiperconectado

A popularização dos bebês reborn e dos relacionamentos amorosos com inteligências artificiais têm evidenciado uma tendência preocupante: o aumento das conexões superficiais em um mundo cada vez mais solitário, e individualista.

A Organização Mundial da Saúde (OMS) declarou, em janeiro deste ano, a solidão como uma epidemia global, destacando seus impactos profundos na saúde mental e emocional da população. O aumento do isolamento social, o uso de chatbots como companheiros e a fuga da realidade por meio de vínculos simulados tornaram-se comportamentos frequentes, especialmente entre jovens e pessoas vulneráveis.

Essa questão de saúde pública tem causado mortes e agravado quadros de depressão em diversas partes do mundo. Um caso emblemático ocorreu na Flórida, onde um garoto de 14 anos tirou a própria vida após passar meses mantendo contato com seu “melhor amigo”: um chatbot programado para simular o personagem favorito dele da série Game of Thrones.

Jullena Normando, pesquisadora em IA, alerta para os perigos dessa crescente “o vínculo com um objeto que simula dependência pode reforçar papeis unilaterais, sem espaço para reciprocidade. Em vez de relações que exigem escuta, negociação e crescimento, nos refugiamos em vínculos onde temos total controle. E isso é um risco para a nossa capacidade de empatia, de cuidado real e de construção de vínculos autênticos.”

Além disso, a professora reforça que, com o avanço acelerado dessas tecnologias, é provável que nos próximos anos surja uma sociedade com menos capacidade de lidar com frustrações e com o outro. “Há ainda o risco político: com os deepfakes, a própria noção de verdade e confiança pode se dissolver, à medida que a IA passa a gerar realidades sintéticas a partir de dados manipulados.”

“Se não formos críticos, a tecnologia deixa de ser ferramenta e passa a ser referência emocional, cognitiva e até moral” Jullena Normando

Jullena Normando é doutoranda sanduíche em Comunicação pela UFG e Universidade da Califórnia, em San Diego. Pesquisadora em Comunicação e Inteligência Artificial.