Especialista analisa os 15 anos do Estatuto da Igualdade Racial

Lei 12.228 é um marco legal que reconhece a existência do racismo e da desigualdade no Brasil

Criada em 20 de julho de 2010, a Lei 12.228 instituiu o Estatuto da Igualdade Racial, que neste mês celebra seus 15 anos. Seu objetivo foi garantir à população negra a efetivação da igualdade de oportunidades, a defesa dos direitos étnicos individuais, coletivos e difusos e o combate à discriminação e às demais formas de intolerância étnica. Ao longo desse período muito se aprendeu.

O advogado criminalista Gabriel Fonseca analisa essa legislação. “O Estatuto é um marco legal que reconhece a existência do racismo e da desigualdade racial no Brasil, algo que antes não estava formalizado de forma tão abrangente. Foi um avanço simbólico e jurídico fundamental, pois legitimou a luta antirracista e deu base para a criação de políticas públicas”, destaca. “A lei estabelece diretrizes para que o Estado atue de forma mais ativa na promoção da igualdade em diversas áreas (saúde, educação, trabalho, cultura, etc.). Isso impulsionou a criação de programas e iniciativas voltados para a população negra”, completa.

Ele, que integra o escritório Celso Cândido de Souza Advogados, ressalta a contribuição da lei. “O Estatuto tem contribuído para a ampliação do debate público sobre racismo e desigualdade racial, trazendo esses temas para a agenda política e social de forma mais contundente. Ele fortaleceu e deu base jurídica para a implementação e expansão de ações afirmativas, como as cotas raciais em universidades e concursos públicos. Essas políticas já existiam em menor escala, mas o Estatuto as consolidou como um instrumento legítimo de correção das desigualdades”, afirma.

Segundo o especialista, a legislação também ajuda com a sociedade. “O Estatuto da Igualdade Racial trouxe, e continua trazendo, um nível de conscientização significativo para as pessoas no Brasil, embora esse processo seja gradual e ainda esteja em curso”, pontua. “O Estatuto não é uma lei meramente declaratória, é um marco legal que visa garantir à população negra a efetivação da igualdade de oportunidades”, completa.

Na prática
Gabriel Fonseca explica que ter uma legislação não significa automaticamente que ela será aplicada de forma efetiva. “A aplicabilidade do Estatuto e da Lei do Racismo (Lei nº 7.716/89) é onde reside o maior gargalo. Falta conscientização dos próprios operadores do direito, para uma melhor aplicabilidade da lei e existe uma grande dificuldade para as vítimas em conseguirem provar o ato delitivo”, ressalta. “Com as recentes alterações da Lei nº 14.532/2023, que equiparou a injúria racial ao crime de racismo, houve um avanço significativo nas punições, tornando a injúria racial inafiançável e imprescritível, com penas de reclusão mais elevadas (2 a 5 anos). Isso é um divisor de águas, pois antes muitos casos de injúria racial acabavam sem a devida punição ou com penas brandas”, analisa.

O especialista dá outros detalhes sobre esse crime, que é um dos mais cometidos. “Injúria racial, quando se ofende a dignidade ou o decoro de alguém em razão de raça, cor, etnia ou procedência nacional com pena de dois a cinco anos e multa. A pena é aumentada de metade se o crime for cometido por duas ou mais pessoas. Se ocorrer em contexto de atividades esportivas, religiosas, artísticas ou culturais destinadas ao público, além da pena de reclusão, há a proibição de frequentar esses locais por três anos. Também há aumento da pena se o crime for cometido por funcionário público no exercício da função.”

Ele cita outros crimes previstos no Estatuto da Igualdade Racial e suas punições. “Impedir ou dificultar o acesso de alguém, devidamente habilitado, a qualquer cargo ou função na Administração Pública. Negar ou impedir a contratação ou a manutenção de emprego em empresa privada por discriminação. Ambos esses crimes têm pena de dois a cinco anos”, pontua. “Também é crime impedir acesso ou recusar atendimento em locais abertos ao público, com pena de um a cinco anos. Impedir ou dificultar o casamento, a convivência familiar ou social por preconceito, com pena de dois a quatro anos”.

Gabriel Fonseca ainda cita outro crime que pode ter a punição aumentada. “Praticar, induzir ou incitar a discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional, com pena de um a três anos e multa. A pena é aumentada para reclusão de dois a cinco anos e multa se o crime for cometido por intermédio dos meios de comunicação social (jornais, rádio, TV) ou publicação em redes sociais, internet ou qualquer outra publicação”, destaca.