A cada ano, mil jovens brasileiros tiram a própria vida, alerta Sociedade de Pediatria

Aproximadamente mil jovens entre 10 e 19 anos tiram suas próprias vidas no Brasil a cada ano. O alerta é da Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP), que no Setembro Amarelo, mês internacionalmente dedicado à prevenção ao suicídio, analisou dados do Sistema de Informação sobre Mortalidade do Ministério da Saúde para melhor compreender as transformações na saúde mental da juventude. Entre 2012 e 2021, quase 10 mil casos de óbitos por lesões autoinfligidas nesta faixa etária foram registrados no Brasil.

Para a presidente do Departamento Científico de Prevenção e Enfrentamento das Causas Externas na Infância e Adolescência da SBP, dra. Luci Pfeiffer, os pais, responsáveis, médicos e toda a sociedade devem estar atentos ao comportamento da população pediátrica. “Devemos tratar com máxima seriedade qualquer atitude ou fala que represente um desejo de morte. A ideação suicida não surge do nada. Ela cresce no pensamento aos poucos até se materializar como uma solução para superar a dor que não mais suportam. Por isso, desde a primeira atitude suspeita, é fundamental ligar o sinal de alerta e buscar ajuda especializada”, esclarece a pediatra.

Algumas das mudanças de comportamento, explica a especialista, que podem ser verificadas em jovens com ideação suicida são: insatisfação ou tristeza constantes; desistência de atividades que antes davam prazer; prática da autolesão; busca por se inserir em situações de risco; e especialmente a falta de metas ou planos para o futuro, em médio e longo prazos.

“Nem sempre eles verbalizam o que está acontecendo. Por isso, é muito importante observar suas atitudes. Antes, o adolescente gostava de praticar esporte ou ir a festas e passeios. Aos poucos, ele começa a dar preferência a ficar isolado, falta às aulas. Muitos passam a se maltratar, como um castigo por culpas que sequer conseguem entender ou elaborar. Fazem cortes pelo corpo, desistem do estudo ou se fixam em atividades isoladas na internet por horas. É certo que algo não está bem”, pontua.

De acordo com o levantamento da SBP, ao longo da série histórica os rapazes representaram mais que o dobro de casos: 6.801 episódios (68,32%), contra 3.153 (31,68%) casos entre as mulheres. Além disso, a maioria dos eventos ocorreram entre os jovens: foram 8.391 óbitos (84,29%) na faixa etária de 15 a 19 anos; e 1.563 mortes (15,71%) na faixa etária de 10 a 14 anos.

De modo geral, o Brasil viu um aumento no número absoluto de suicídios em todas as regiões ao longo da última década. A região Norte apresentou o maior crescimento no número de casos no período, com um aumento de 115%. São Paulo, sendo o estado mais populoso, também teve o maior número de suicídios no período.

Embora sejam necessários estudos sobre as razões subjacentes a esse aumento para implementar estratégias de prevenção eficazes, na avaliação da dra. Luci Pfeiffer, existem diversas causas que podem levar crianças e adolescentes ao sofrimento psíquico e posteriormente à ideação suicida. No geral, a violência intrafamiliar e doméstica costuma ser uma das principais. Também são recorrentes motivos como: o abandono; a perda de pessoas significativas; a rejeição; o sentimento de culpa; os traumas; as insatisfações consigo mesmo; e as exigências excessivas do mundo atual, a maioria trazida pela internet. Há ainda a nefasta divulgação da escolha da morte nos meios digitais como uma forma de solução.

“O apelo da SBP é para que todos passem a prestem mais atenção nesse tema, inclusiva na faixa etária pediátrica. A família é a base para toda formação do indivíduo. A criança e o adolescente precisam de cuidado, carinho, estímulo e proteção do mundo adulto que os cerca. Precisamos escutar e acolher. Em situações de grande sofrimento, nas quais eles não encontram solução, nem amparo em seus meios sociais, a ideia de que acabar com sua vida acabará com o seu sofrer pode surgir e crescer no pensamento. É preciso interromper este caminho antes que a ideação suicida se torne um plano prático. O suicídio não é algo tão incomum quanto as pessoas imaginam. Infelizmente, pode estar próximo de nós. Em caso de suspeita de sofrimento psíquico, procure um pediatra ou profissional da saúde mental para interromper essa trajetória”, orienta a especialista.